A Inquisição – Visão Crítica

Muitas  controvérsias  surgiram  acerca deste melindroso e delicado assunto. Se por um lado a história registra excessos e atrocidades,  muitas mentiras  também foram levantadas com o único objetivo de  caluniar   a Igreja Católica.  Foram períodos  duros para a Igreja, que teve de agir  com veemência diante do surgimento de heresias  que ameaçavam destruir os princípios básicos da Sã Doutrina.   Entretanto, para  entendermos os excessos  e grandes abusos  na aplicação do regimento da Santa Inquisição,  devemos estudar também a questão da investiduras, que será tratado num tópico à parte.   Resumidamente, podemos dizer que naquela ocasião os soberanos exerciam forte interferência política nas decisões regionais da Igreja, muitas vezes influenciando diretamente na escolha de bispos e padres. Muitos deles santificaram-se nos cargos em que foram investidos. Outros, porém,  sem o menor resquício de vocação religiosa, aceitavam tal condição unicamente para atender os interesses  dos nobres.  Um tipo de influência política semelhante  a história registrou no caso do julgamento de Santa Joana D’Arc, apesar de nesta época  a questão das investiduras ser já uma página virada. Ao ser aprisionada quando tentava libertar a cidade de Compiègne, foi sumariamente sentenciada sem que pudesse recorrer às instâncias superiores da Igreja. Assim,  apoiada pelo clero francês, acabou sendo condenada à morte como herética pelo clero inglês e, ao  apelar para o Papa, o Bispo francês Pedro Cauchon, simpático à coroa inglesa, retrucou: “O Papa está muito longe”.  Aplicou-se , assim  a pena capital através de uma decisão iníqua, maliciosa e política, sem direito à apelação, sem o conhecimento do Papa. Não é à toa  ser notório que muitos  acusam e responsabilizam a  Santa Igreja por tais excessos. Sem conhecimento de  causa,  ignoraram a má conduta daqueles  falsos  pastores, políticos e iníquos que,  usurpando suas funções eclesiais, aplicavam  penas capitais baseada nos seus interesses escusos.  Não fosse  assim   Santa Joana D’Arc não teria sido elevada aos altares, para honra dos católicos e  glória de Deus. Estudemos a inquisição:

Pode-se  dizer que a Igreja Católica foi a alma da sociedade feudal, onde o clero era constituído como a única classe letrada e, os servos e senhores, na maioria ignorantes e completamente analfabetos.  Os sacerdotes, arcebispos, padres e párocos constituiam o clero secular, porque seus membros viviam na sociedade ou no mundo (do latim seculum). Os bispos governavam uma diocese constituída de várias paróquias e administravam em nome da Igreja. Já o clero regular era  dividido em diversos  grupos de comunidades e, cada comunidade de convento que obedecia à mesma regra,  denominava-se , como ainda hoje denomina-se “ordem”.  A importância do clero regular na cultura medieval foi enorme.   Bastaria dizer-se que as obras mestras da literatura latina chegaram até os nossos dias através dos manuscritos copiados pelos monges. O respeito que impunham criava ao redor dos mosteiros uma zona de segurança, onde a massa campesina encontrava asilo e proteção. A Igreja enaltecia a dignidade do trabalho, dando o exemplo com a operosidade de seus monges na agricultura: “Ora et labora”  – reza e trabalha.

Os tribunais eclesiásticos eram importantíssimos  na idade média, pois não julgavam somente os membros do clero, mas se pronunciavam sobre todos os  assuntos que direta ou indiretamente se vinculavam à Igreja, tais como contratos celebrados  sob juramento, testamentos, questões referentes à órfãos  e viúvas, bruxarias, sacrilégios, etc.

A maneira de julgar dos tribunais  eclesiásticos era sumamente mais justa que os  processos bárbaros utilizados pela justiça feudal, como os “ordálios” e “juízos de Deus”.  Nos tribunais ordálios exigia-se que o acusado provasse sua inocência colocando a mão no fogo ou água fervente.  Os “juízos de Deus”  submetiam o acusador e o acusado à luta, e tinha ganho de causa o vencedor.   O julgamento da Igreja Católica pautava-se por um conjunto de normas que constituíam o direito canônico, o qual proporcionava aos acusados defesa  muito mais amplas e penas menos severas, razão por que a maioria das pessoas procurava estar sob jurisdição eclesiástica. 

Também para coibir  dissidências que  pudessem eventualmente atingir os princípios  básicos da sã doutrina, dispunha a Igreja da excomunhão. O excomungado era  excluído da comunidade dos fiéis, não podendo receber os sacramentos e os católicos  não podiam ter nenhuma relação ou contato com ele.  Quando os senhores feudais excomungados persistiam em rebeldia , a Igreja lançava então a interdição, que significava a proibição da realização de qualquer  cerimônia religiosa no feudo.

Os princípios básicos da Inquisição  remontam ao ano de 1184, quando, pelo Concílio de Verona , tornou-se órgão de investigação e combate às heresias.   O tribunal do Santo Ofício, a princípio,  definiu as atribuições que seriam exercidas pelos bispos especialmente delegados, penetrando em diversos países  da Europa, mas só adquiriu  força na península ibérica, Itália, França e Alemanha.

Em 1231, através o Papa Gregório IX lança a bula Excommunicamus, que estabelecia a Santa Inquisição, tendo adquirido funcionamento próprio através de um decreto, de 1233,  sistematizando leis e jurisprudências  acerca dos crimes relativos  à feitiçaria, blasfêmia, usura e heresias.   Os processos   eram constituídos a partir de denúncias  e confissões, feitas muitas vezes para evitar de  incorrer em um outro crime considerado pior: o de ser “fautor de hereges”, isto é, acobertar ou fomentar as heresias. As penas aplicadas tinha uma gradação de penas que iam do jejum, multas, pequenas penitências e até a prisão. Nos casos considerados mais graves, os acusados eram entregues ao “braço secular”, isto é, à autoridade civil, a qual geralmente aplicava a pena máxima da morte na fogueira, em um ato público, chamado, “auto de fé”, isso em casos extremos em que o herege, voluntariamente negava-se a pedir perdão ou a retratar-se.

O estabelecimento das leis do Santo Ofício firmaram-se, principalmente, por causa da reação da própria sociedade.  Praticamente unânime de pensamento e espírito cristão,  mobilizam-se contra fortes  correntes que rejeitam e atacam a doutrina e organização da Igreja.  Tais movimentos heréticos  organizam-se e influenciam fortemente o  ambiente por intensa propaganda. Destacando os cátaros e albingenses, que julgam descobrir  radical oposição entre o Bom (almas puras) e o Mau (resto do mundo), além de  consideraram o matrimônio e a procriação como invenção do demônio;  rejeitam o juramento de  fidelidade, bem como os sacramentos, a  hierarquia da Igreja, os dias de festa, construção de igrejas, etc.  Antes de  1200,  ocorrera, muitas vezes, que o povo linchasse  a  hereges presos, “porque tinha medo”, assim  reza o documento,  “que o clero fosse demasiadamente clemente”.

 Posteriormente, após o assentamento das leis da inquisição, o bispo na qualidade de juiz papal assume os encargos da inquisição sobre determinados casos na sua jurisdição eclesiástica e, nesta fase,  em inúmeros  casos,  tal poder eclesial  assume caráter eminentemente político.  O rei  tinha o poder de nomear bispos e padres e tal investidura, muitas vezes, representava interesse bilateral, onde a troca de favores podia ser uma inclinação natural para personalidades voltadas à planos terrenos, e não divinos, como deveriam ser. 

Em consequência disso,  foram sendo desvirtuados os verdadeiros objetivos das leis  do Santo Ofício.  Pessoas condenadas à fogueira, na maioria das vezes,  eram  sentenciadas por membros do clero em atendimento aos interesses dos soberanos,  vezes sem par, à revelia do Papa. A questão, portanto,  sutilmente embaralhava questões políticas com religiosas  e essa confusão ainda ecoa nos dias atuais. Sem dúvida, muitas barbaridades foram cometidas, a maioria delas em nome do Papa e da Santa Madre Igreja. Em nome da Igreja, e não pela Igreja. Daí a necessidade de pelo menos tentarmos entender, mesmo que palidamente tais questões  e seus reflexos exercidos por maus pastores atraídos  aos  cargos eclesiásticos, não por vocação, mas com a flagrante intenção de trocas de interesses e favores políticos.  Surpreendentemente, muitos  destes homens que receberam tais investiduras, eram santos religiosos,  piedosos. Pela inata nobreza de caráter, preferiram fidelidade a Roma a serem  servis aos interesses do rei. Pagando com a vida, assumiram as  honras  dos altares.

Em 1542 a Inquisição foi restabelecida como órgão oficial da Igreja, revigorado e dirigido de Roma pelo Santo Ofício, sendo que seu objetivo era deter  com violência  o avanço protestante em Portugal, Espanha e Itália. Tempos de significativas mudanças no mapa religioso e político da Europa.

Devemos  ressaltar ainda que há muitas  divergências entre os historiadores  sobre a questão da  inquisição. Sem dúvida,  o tempo nos separou daquele capítulo longínquo, de forma que estabelecer um raciocínio preciso sobre tais acontecimentos talvez nos seja impossível.  As circunstâncias da época,  os conceitos da sociedade, as decisões do clero e  do poder  civil,  toma um vulto demasiadamente complexo e talvez incompreensível para a sociedade contemporânea.  O certo é que  críticas  a respeito e os conseqüentes ataques à Igreja  sem conhecimento de causa é, no mínimo, leviandade.  Como católicos  sabemos que os Papas da época agiram acertadamente,  apesar das sérias conseqüências daí advindas.  Fatos  que nos serão esclarecidos em sua plenitude na eternidade.  

Fonte: Página Oriente

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