Breves anotações sobre o infanticídio

Muitas vezes, perplexos, lemos nos jornais casos de mães que, logo após o parto, matam seu próprio filho. Apesar da repugnância que nos causa este tipo de conduta, a figura do crime de infanticídio foi criado pelo legislador para atenuar a punição.

Desta forma, por questões de política criminal, previu-se o tipo penal do infanticídio, que nada mais é do que um homicídio privilegiado. O preceito primário consistindo em matar o próprio filho, sob influência do estado puerperal, durante o parto ou logo após, e estando previsto no art. 123 do CP com pena de detenção de dois a seis anos. Por outro lado, o crime de homicídio, previsto no art. 121 do CP, apena com reclusão de seis a vinte anos a conduta de matar alguém, ou seja, pune mais severamente.

Para a caracterização do infanticídio é necessário que a conduta matar seja durante o parto, ou seja, a partir da dilatação do colo do útero até a expulsão da placenta ou, logo após. Para o perito legista o logo após é quando a criança ainda está coberta de sangue, enduto sebácio e o cordão umbilical ligado à placenta. Para o jurista este conceito é mitigado para ampliar os casos de incidência do privilégio.

O estado puerperal é uma pertubação psicológica que a mãe sofre entre  o deslocamento e expulsão da placenta e à volta do organismo materno às condições normais. Na verdade não há uma comprovação científica de alteração real da capacidade de discernimento, sendo apenas uma ficção jurídica para apenar menos severamente o homicídio praticado nessas condições.      

No nosso trabalho de Autoridades Policiais muitas vezes nos deparamos com situações que necessitam de um laudo pericial para a correta tipificação. Um bom exemplo são as ocorrências que beiram o aborto, o infanticídio e o homicídio de recém-nascido.

Sendo assim, é importante diferenciar os sujeitos passivos. No primeiro a “morte” ocorre no útero e denomina-se feto.  No segundo a morte ocorre durante ou logo após o nascimento, e é denominado recém-nascido. No último, são os casos que não têm adequação típica com o delito de infanticídio.

Um dos exames periciais utilizados para dirimir a dúvida entre o nascimento com vida e posterior morte do recém-nascido e, a “morte” dentro do útero é a Docimásia Pulmonar Hidroestática de Galenono.

Este exame consiste, basicamente, em colocar em um recipiente com água o pulmão do feto ou recém-nascido examinado. Se o examinado nasceu com vida, ou seja, respirou, seu pulmão irá flutuar uma vez que os alvéolos pulmonares estão cheios de ar. Caso afunde significa que o mesmo não nasceu com vida, sendo sujeito passivo do crime de aborto. É, preciso ressaltar que são necessários exames complementares uma vez que o resultado pode ser mascarado pela aspiração de secreções vaginais fazendo com que o pulmão do recém-nascido afunde e, também, o do feto pode flutuar devido aos gases do processo de putrefação. Nesses casos, seria adequado um exame de Docimásia microscópica que consiste em examinar os auvéolos uma vez que estes só abrem com a efetiva respiração.  

            Para concluir, vale resaltar que algumas mulheres têm uma real alteração do psiquismo. Ocorreria, por ocasião do parto, o desenvolvimento de uma personalidade psicopática. Esta psicóse-puerperal seria uma verdadeira pertubação da saúde mental. Nesses casos, acarreta uma redução da capacidade penal, sendo uma das espécies de semi-imputabilidade previstas no art. 26, parágrafo único do CP.

Beatriz Senra Calmon

Delegada de Polícia

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