VOCÊS ESTÃO PERDOADOS

Era uma vez…
 
Uma turma de alunos adolescentes, considerada a mais indisciplinada de todas, estava sempre causando confusão na escola. Quase todo dia havia alguém na sala da diretoria, levado para lá por ter "aprontado alguma". As conversas com os coordenadores, com o diretor, as advertências orais e por escrito e as suspensões por alguns dias, de muito pouco adiantavam. A cada dia que passava o comportamento dos alunos piorava. Foi então que uma professora propôs que eles mesmos criassem regras disciplinares para serem aplicadas em caso de mau comportamento, já que as estabelecidas pela escola não eram do agrado deles, nem estavam funcionando.
 
Neste dia eles estavam agitados como nunca, falando todos ao mesmo tempo, discutindo uns com os outros, uma verdadeira Torre de Babel reeditada. O ar estava pesado, como acontece na natureza nos momentos que antecedem às tempestades. Mas foi só a professora propor isto e fez-se um silêncio profundo, instaurou-se a perplexidade. Os alunos se entreolhavam desconfiados, sentiam-se incapazes de se colocar no lugar do outro e estabelecer suas próprias regras. Isso pressupunha assumir responsabilidades. Podia-se até ouvir os passos de alguém que subia as escadas naquele instante.
Curiosamente, não se sabe vindo de onde, talvez da única árvore existente no pátio da escola, um pequeno beija-flor entrou pela janela aberta. Ficou pairando suspenso no ar, bem em frente ao antigo mapa mundi, como a demonstrar: o auto-controle é possível, não se preocupem, creiam, renovem-se e vocês já estão perdoados . Todos os olhares se dirigiam para a ave, ninguém mexia um músculo para não assustar o pássaro e prolongar o mais possível a beleza daquela visão/revelação. 
 
Um carro de propaganda que passava na rua da escola, com o som no volume máximo, anunciando o circo que chegava a cidade no final da semana, acabou com a poesia-viva criada e o beija -flor num vôo rasante saiu, para a tristeza geral, pela mesma janela que entrara. O líder da turma indignado, subiu na mesa da professora num salto e com o braço levantado, como quem empunha uma espada, vaticinou: ninguém daqui vai a este circo, porque se for nunca mais vai ver um beija-flor.
Depois, já de volta ao chão, talvez por ter percebido o insólito da situação e das palavras que pronunciara, o menino caiu na gargalhada, no que foi acompanhado pela turma toda. Até mesmo a professora não parava mais de rir. Era o sol saindo após dias de chuva, era a alegria entrando misericordiosamente, naqueles corações.
 
À partir daquela tarde, era comum se ouvir pelos corredores da escola, ou mesmo fora dela (essa história se espalhou pela comunidade toda), quando alguém fazia algo que não agradava a seguinte expressão: "para com isso ou o beija-flor vai embora". Estava criada a única regra disciplinar que eles precisavam, saída de suas próprias experiências, uma regra simples de convivência em sociedade, o entendimento de que a cada ato cabe uma conseqüência, de que nem sempre é o "circo" o melhor, de que a poesia da vida simples, criada por Deus traz felicidade, liberta a alegria e faz brotar o verdadeiro Amor.
 
E a turma indisciplinada? Vocês podem estar se perguntando agora. Como ficou? Ficou do jeitinho que Deus sempre quis, aqueles adolescentes "criaram asas" e hoje são quase todos, mensageiros daquele mesmo Amor revelado pela visão do pequenino beija-flor.
Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, 12 de agosto de 2004

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