Economia e moral

A presente crise econômica mundial força as instituições financeiras e outras a produzirem diagnósticos e análises prospectivas do funcionamento do mercado e seus desdobramentos. Estes diagnósticos e análises tocam os mais variados produtos e insumos mostrando os elementos que configuram os pontos positivos e negativos, gerando cautelas e indicando atenções especiais. Em conseqüência muitos ajustamentos são feitos nos funcionamentos empresariais com adequações que incidem sobre a vida dos cidadãos todos, atingindo particularmente os que já estão em situação de maior fragilidade social. Assim, quem tem o poder do dinheiro ou transita com propriedade nas suas esferas calcula, define, escolhe, fica na espreita, aposta e busca os caminhos que permitam a garantia de seu equilíbrio e crescimento. Todo esse movimento complexo e variado se faz com o olhar fixado num centro complexo de controle e determinações de onde parece emanar o que pode definir a superação da crise econômica. São incertezas que pairam nos ares.

Neste momento e neste horizonte da crise não pode faltar a iluminação que vem da relação entre moral e economia. O que é próprio da composição técnica da economia não pode prescindir desta iluminação que vem da relação intrínseca entre moral e economia. A Doutrina Social da Igreja sublinha que a atividade econômica e o comportamento moral se compenetram intimamente. Não pode faltar no conjunto das diagnoses e análises este componente de caráter moral. A crise toca a materialidade de funcionamentos e produtos. Mas, tem também um enraizamento profundo na dimensão moral. Ora, se é verdade que existe uma clara distinção entre economia e moral, não é verdade que existe uma separação entre estes dois âmbitos. Há, na verdade, uma reciprocidade entre eles. É lamentável que as vozes que se levantam a partir do âmbito moral não sejam ainda suficientemente fortes para convencer os atores deste cenário a levarem em conta as implicações morais que subjazem em toda esta realidade da crise econômica mundial.

O Papa Pio XI, numa página da sua Carta Encíclica ‘Quadragesimo anno’, 40 anos de comemoração da importante encíclica social de Leão XIII, a Rerum Novarum, diz: “Pois ainda que a economia e a moral se regulem, cada uma no seu âmbito, por princípios próprios, é erro julgar a ordem econômica e a moral tão afastadas e alheias entre si, que de modo nenhum aquela dependa desta. Com efeito, as chamadas leis econômicas, deduzidas da própria natureza das coisas e da índole do corpo e da alma, determinam quais os fins a que a atividade humana se não pode propor, e os que pode procurar no campo econômico, bem como os meios que deve usar para os conseguir, e a razão mostra claramente, da própria natureza das coisas e da natureza individual e social do homem, o fim proposto pelo criador a toda ordem econômica. Por sua parte, a lei moral manda-nos perseguir tanto o fim supremo e último em todo o exercício de nossa atividade, como nos diferentes domínios por onde ela se reparte, os fins particulares impostos pela natureza, ou melhor, por Deus, autor da mesma, subordinando sempre estes fins àquele, como pede a boa ordem”.

Assim, reza a Doutrina Social da Igreja, como se deve no âmbito moral ter em conta as razões e exigências da economia, atuando no campo econômico é imperioso abrir-se às instâncias morais. Importante neste horizonte é a afirmação advertência que o Concílio Vaticano II fez pela Constituição Pastoral Gaudium et Spes, n. 63, ao tratar  a realidade humana, social e política iluminada pelos valores transcendentes: “Também na vida econômico-social a dignidade da pessoa humana, com sua vocação integral, bem como de toda a sociedade, deve ser honrada e promovida. O homem com efeito é o autor, o centro e o fim de toda a vida econômico-social”. Esta consideração focaliza que à economia, tanto no âmbito científico como no âmbito prático, não é confiado o fim da realização do homem e da boa convivência humana, mas uma tarefa parcial. Isto é, a produção, a distribuição e o consumo dos bens materiais e dos serviços.

Portanto, a crise econômica tem que ter ouvidos para os clamores que levam a economia e a moral a considerar como finalidades indivisíveis a eficiência econômica e a promoção de um desenvolvimento solidário da humanidade. Vivida moralmente a economia alcança seu equilíbrio, ganha consistência e atinge o que é insubstituível nos patamares da justiça e da solidariedade mediante a produção de bens e serviços úteis ao crescimento de cada um. Os operadores econômicos e os cultores das ciências econômicas estão, particularmente, desafiados na tarefa árdua de conceber, realizar e corrigir projetos econômico-sociais capazes de promover projetos econômico-sociais para uma sociedade mais equitativa e um mundo mais humano. 

 

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